Site Autárquico Loulé

Igreja de Nossa Senhora da Assunção - Querença

Nos princípios do século XVI este templo era uma simples ermida pertencente à freguesia de São Clemente de Loulé – "a qual é uma casa só e tem uma capela pequena e as paredes dela são de pedra e cal e cobertas de telha vã" (Visitação da Ordem de Santiago ao Algarve em 1517-1518).

O actual edifício remonta às décadas de 1520­-1530, ocasião em que se procedeu à reconstrução da ermida sobrevivendo desta campanha a porta principal "de pedraria com uns cordões (...) redonda, oitavada, de pedraria da terra, tem dez palmos de alto e de vão quatro". Diante dela havia também "um al­pendre com colunas e capitéis de pedraria" (Visita­ções da Ordem Militar de Santiago de 1534 e 1554).

Pouco tempo depois este templo era elevado a sede da freguesia de Querença, registando-se qua­renta e cinco fregueses, cento e trinta e sete de comu­nhão e confissão e sessenta de confissão somente.

O retábulo principal então construído, do qual não sobrevivem vestígios, foi um interessante tes­temunho da talha do Primeiro Renascimento con­forme se atesta pela descrição efectuada em 1554 – "pilares, molduras, encoroamentos lavrados de ro­mano (...) um sacrário lavrado de romano (...)".

Apesar de não ter chegado aos nossos dias nenhuma das alfaias em tecido referenciadas nas visitações quinhentistas, convém destacar uma ves­timenta de pano pintado da Flandres em 1518, duas mesas de toalhas da Flandres em 1534, ainda neste último ano um manto de damasco da Índia, um frontal de Chaúl e uma toalha de pano da Índia e finalmente em 1554 uma vestimenta de damasco da Índia. À semelhança do que ocorreu noutros tem­plos algarvios, foi corrente no século XVI o recurso a tecidos e nalguns casos a bordados importados da Flandres e da Índia.

O terramoto de 1755 provocou algumas ruínas nesta igreja, cujas reparações foram efectuadas nos anos seguintes, sendo desta época a torre sineira, O actual frontão da fachada principal e a janela emol­durada que ilumina o coro alto datam provavelmente de 1871.

Já nos nossos dias a igreja sofreu uma campanha de obras inadequada, colocando-se uma cobertura de betão, um lambril de azulejos na nave e na capela­-mor e parquet no pavimento.

Em 1728 iniciou-se a renovação da orna­mentação interior deste templo. O retábulo principal foi então ajustado notarialmente entre a Comissão Fabriqueira e o maior entalhador da época, o mestre Manuel Martins. De seguida, foram executados os dois retábulos colaterais ao arco triunfal, da invocação de Nossa Senhora do Rosá­rio e de Santo António.

Todos estes retábulos inserem-se nos modelos mais frequentes na época: o principal apresenta planta plana ou recta, três tramos com quatro colunas pseudo-salomónicas, ao centro uma grande tribuna com um trono e uma nova imagem da padroeira, nos intercolúneos mísulas com imagens de vulto perfeito, o ático tem dois arcos plenos, salomónicos, quatro raios e uma cartela central.

Os dois retábulos colaterais são gémeos e têm somente um tramo com um par de colunas pseudo-salomónicas, onde figura ao centro a imagem do orago, o entablamento percorre todo o retábulo e o ático apresenta enrolamentos acânticos.

Na campanha efectuada na primeira metade do século XVIII construíram-se ainda na nave da igreja dois retábulos laterais fronteiros um ao outro, ambos seguindo o formulário barroco. Enquanto que o da capela de São Pedro segue a tipologia mais frequente, o da capela do Senhor Crucificado adopta soluções menos usuais, nomeadamente a planta côncava e um só tramo delimitado por dois pares de colunas pseudo-salomónicas e dois pares de pilastras. Por sua vez o ático apresenta quatro arquivoltas concêntricas e três raios rematados por cabeças de serafins.

Este último retábulo foi dourado em 1741 pelo pintor Diogo de Sousa e Sarre, com oficina em Loulé. Convém ainda lembrar que esta capela era admi­nistrada pela Confraria das Almas do Purgatório.

O retábulo construído na década de 1540 utilizou o formulário do Primeiro Renascimento. No tramo central havia um encasamento ou tribuna onde estava colocada a representação escultórica da padroeira – Nossa Senhora da Assunção.

Esta imagem de madeira (138cmx45cm) consti­tui um interessante exemplar do Primeiro Renas­cimento, apesar do restauro anacrónico realizado no século XX.

De realçar a larga aceitação religiosa que tinha no século XVIII, pois passava por milagrosa "o que infiro dos muitos braços, pernas, cabeças, mãos, pés, olhos, dentes, orelhas e corpos inteiros de massa ou cera que os favorecidos vêm ofertar à mesma Senhora" (Memórias Paroquiais de 1758).

A pia baptismal é uma interessante manifestação da época manuelina. Foi executada pouco antes de 1534, ano em que é referida na Visitação da Ordem de Santiago e qualificada de "muito bem obrada".

De entre os ornatos que apresenta destaca-se um cordão espiralado que envolve a taça e uma cena de caça em que um cão procura um coelho junto à vegetação.

O tratamento ingénuo dos dois animais, nomea­damente das cabeças e a desproporcionalidade destas em relação aos corpos, denota o trabalho de um canteiro local.

Trata-se de mais uma prova da afirmação algar­via como centro de produção artística nos finais do século XV e nos princípios do XVI.